O convite foi formulado, aceite... e assim os voltei a ter comigo.
Na sequência do Dia da Mulher (e porque este deve acontecer todos os dias), a Biblioteca do Agrupamento de Escolas Dr. Manuel Laranjeira (AEML) tem o seu espaço ocupado pela presença de
uma poeta de abril: Sophia de Mello Breyner Andresen.
À entrada da escola, nos corredores do edifício, a presença feminina evidencia-se, assim todos possam educar-se com os contributos que muitas mulheres têm deixado, em diversas áreas, para a Humanidade.
Convidaram-me a partilhar, com alunos de 12º ano, a minha leitura de alguns poemas de Sophia, da minha visão acerca da sua vida e obra. Tarefa difícil, por certo, dada a grandeza de quem foi falado e de quem ia ouvir. Muitas caras familiares suavizaram o registo, pela lembrança do bem vivido.
Enquadrada no tema do Plano Anual de Atividades deste ano letivo ("74:24 - o que cabe em 50 anos"), a poesia é tópico de relevo, na expressão comprometida e transfiguradora da sociedade. Se com Antero de Quental a máxima foi "A poesia é a voz da revolução", com a autora de
Poesia (1944),
Dia do Mar (1947),
Coral (1950),
O Livro Sexto (1962),
Grades (1970),
Ilhas (1990), entre muitos outros contributos poéticos, conjugaram-se as forças da terra,
da natureza, do mar,
da cultura e da erudição para a luz da libertação e da liberdade.
Sublinhei os traços da ascendência aristocrática num puzzle onde generosidade, humildade se refletem em poemas breves com mensagens eternas, como a da entrega e da dádiva poéticas ao leitor:
EPIDAURO 62
Oiço a voz subir os últimos degraus
Oiço a palavra alada impessoal
Que reconheço por não ser já minha
(in Ilhas, 1990)
Três a cinco versos bastam para trazerem a vida, o(s) tempo(s), a cultura, a pátria, os valores da justiça, da verdade e da dignidade humana à reflexão.
Obra de Sophia numa das secções da exposição, na Biblioteca do AEML (foto JR)
Na versatilidade da obra (em modo lírico, dramático ou narrativo), há imaginário(s) rico(s) portador(es) de valores que compõem uma ética que apela à viagem, à descoberta, à origem da luz, do cristalino, da concha, da onda, da força que o ser humano transporta como "O super-homem".
As flores da celebração eram as da primavera, do jardim, mas também as da liberdade - que se viram no poema, no mar, na
madrugada (25 de abril) que quebrou a noite e o silêncio (do regime ditatorial).
Assim os versos da poeta foram evocados, lidos, partilhados na mensagem de energia, de passagem, de aprendizagem e de vida que traduzem.
CORAL
Ia e vinha
E a cada coisa perguntava
Que nome tinha.
(in Coral, 1950)
Se não tiver ficado a vontade de voltar a Sophia (na poesia, no passeio junto à Granja, na visita ao Panteão, na descoberta do Epidauro, na ironia que perpassa em "As Pessoas Sensíveis"), que esta tenha sido a razão para a vivência de uma libertação; de um momento de recordação; de reencontro com um tempo passado, num presente a caminho de futuro. Com História e com o agradecimento à MCB.