terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Acordo e acentuação (das paroxítonas... ou graves)

     Retomo um comentário anterior, na sequência de novos dados encarados como dúbios.

     Q: Tenho uma dúvida,relativamente ao acordo ortográfico, que é a seguinte:
       segundo a base IX - da acentuação gráfica das palavras paroxítonas, a propósito da acentuação das formas verbais de pretérito perfeito do indicativo 1ª pessoa, plural, (ex.: amámos) -, «é facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais...para as distinguir das correspondentes formas do presente do indicativo já que o timbre da vogal tónica é aberto naquele caso em certas variantes do português». Pelo que eu entendo, esse carácter facultativo tanto se aplica à variante do Português Europeu como à do Brasil; o mesmo acontecerá com o acento circunflexo (facultativamente) para 'dêmos' (1ª pessoa do plural no presente do conjuntivo), ainda que se distinga da correspondente forma do pretérito perfeito do indicativo: Demos». É ou não é esta a interpretação?

     Acontece que já vi, em duas publicações, o assunto tratado de duas formas diferentes; isto é, numa diz que em Portugal mantém-se o acento em «louvámos» e «dêmos»; na outra diz que só acentua quem quiser. Afinal, qual é a versão correcta?

    R:  Pelo texto do acordo, de facto, fica a noção de facultatividade nos casos associados a ‘falamos / falámos’, numa primeira leitura. Todavia, há a considerar o facto de o normativo ser para aplicação nas diferentes variedades (europeia e não europeia) do Português.
    Ora, nesta medida, o carácter facultativo da acentuação prende-se com o facto de o acordo respeitar, genericamente, as várias normas cultas da língua (nomeadamente a lusoafricana e a brasileira), particularmente o que se relaciona com a dimensão fonética. Assim, no Acordo Ortográfico, o caso de acentuação em apreço é facultativo para a generalidade dos países e das respectivas línguas, na medida em que coexistem formas diferentes de pronunciar e/ou grafar as palavras nessas variedades, perspectivadas em conjunto; na medida em que não há oposição distintiva na realização fonética dos dois tempos verbais (recorrendo-se sempre ao som aberto). Focalizando apenas o caso do Português na sua variedade europeia, a situação é diferente. Isto porque há distintividade entre 'falámos / falamos' e 'dêmos / demos' na chamada norma culta ou padrão. 
     Assim, e de novo remetendo para o comentário já produzido, há uma observação na edição aí publicitada (da responsabilidade da Imprensa Nacional Casa da Moeda e da Associação de Professores de Português), a qual sustenta esta leitura do acordo. Essa mesma observação vai ao encontro de uma outra publicação, da autoria do Professor João Malaca Casteleiro e Pedro Dinis Correia, na qual se pode ler o seguinte, na página 31:

    “O Novo Acordo prevê que se assinale, na norma culta lusoafricana, com acento agudo, nos verbos regulares da primeira conjugação, a terminação da primeira pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo, de modo a distingui-la das correspondentes formas do presente do indicativo, e que, na norma culta brasileira, não haja distinção dessas formas. 
      Deste modo, coexistem para as formas do pretérito perfeito na primeira pessoa do plural: 
    andámos , cantámos, lavámos, na norma culta lusoafricana; 
    andamos, cantamos, lavamos, na norma culta brasileira.” 

    O mesmo critério se aplica ao contraste 'demos / dêmos' (não realizado na norma culta brasileira, mas distintivo na norma lusoafricana), conforme também se pode ler na sequência da última publicação citada. 

    Um caso em que se motiva dizer que o acordo não é absoluto (alguma vez o terá sido?), caminhando apenas na convenção do possível, segundo critérios que, por vezes, têm muito pouco de domínio gráfico e muito mais de fonético.

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