segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Um Justo entre as Nações

         Na tradução do hebraico, o justo é um não-judeu merecedor do paraíso. 

       Atualmente, o estado de Israel refere-se assim às personalidades (góis/gentios) que arriscaram as suas próprias vidas durante o Holocausto, para salvar judeus do extermínio perpetrado pelo nazismo.
       Além do nome Carlos Almeida Fonseca de Sampayo Garrido (embaixador em Budapeste que salvou muitos judeus húngaros), o de Aristides Sousa Mendes figura numa lista que reconhece a humanidade, o exemplo e o espírito solidário e comprometido com o ser humano - o elenco daqueles que conseguem ver o Homem muito para lá das retóricas, dos interesses e dos jogos políticos. Não se ficando pelas palavras, agiram, não obstante as consequências dos seus atos nas próprias vidas.
      O caso de Aristides de Sousa Mendes é ainda hoje para-digmático: de cônsul em Bordéus a refugiado no próprio país (recebendo o auxílio da assistência judaica interna-cional, para sobreviver a uma perseguição política conduzida por Salazar), diz-se que morreu em Lisboa com um hábito franciscano (por não ter sequer um fato próprio).
       Em filme e com o título "Aristides de Sousa Mendes - o Cônsul de Bordéus" (dirigido por João Correa e Francisco Manso), divulga-se a condição deste Grande Homem (que assinou, contra a ordem de Salazar e a famigerada Circular 14, mais de trinta mil vistos, para que tantas vidas judaicas pudessem chegar a Portugal, oriundas da Europa invadida por Hitler e salvas da perseguição nazi).


       Numa narrativa que foca o percurso de um maestro judeu (Aaron Apelman) - o qual acaba por reencontrar uma irmã que julgava morta -, ativam-se várias sequências fílmicas em analepse, para que se conheça a ação grandiosa daquele também conhecido como o Schindler português.


       Entre o percurso do maestro (ficcionalmente construído graças à intervenção do diplomata português) e o da irmã Esther (uma sobrevivente em condições mais encaradas como de maior incógnita e incerteza), dá-se relevo ao sucesso da liberdade, do reencontro, da (re)união. E no seio deste há Aristides de Sousa Mendes, tal como a música a harmonizar o que, no universo, possa ser o maior de todos os desconcertos: o esquecimento e a aniquilação do ser humano, independentemente de credo, sexo e raça.

      Se quem salva uma vida salva o universo, Aristides de Sousa Mendes devia já hoje ser merecedor de múltiplos sinais do que injustamente não teve em vida: o reconhecimento universal - a começar por todos os portugueses - da sua a(tua)ção junto de um povo cuja diáspora é imemorial.

2 comentários:

  1. Para além de Aristides de Sousa Mendes que, a par da música, como tu tão bem dizes, harmonizou o desconcerto do esquecimento e da aniquilação, há no filme uma frase que me ficou: "Depois de Moisés vencer o mar vermelho, nada mais temos a temer!"

    Se bem que eu não possa garantir a fidelidade da citação, porque a minha memória, ultimamente, tem-me pregado partidas!

    A frase é proferida duas vezes no filme e, penso eu, não é por acaso.
    Ela vinca a esperança que deve persistir para que o Mal não vença e para que cada um de nós possa fazer as opções corretas, mesmo nos momentos mais difíceis.

    Exemplo disso é a personagem que dá nome ao filme. Remou contra a maré, desobedeceu ao timoneiro Salazar.
    Porque ele sabia bem o que aconteceria se seguisse cegamente a "famigerada Circular 14"!

    Efetivamente,o que nos define como pessoas são as escolhas que fazemos! E Ele, Aristides, fez a sua.

    Saibamos nós fazer as nossas!

    bjinho e até ao próximo filme!
    IA

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    1. É verdade. A questão do livre arbítrio diferencia-nos.
      Por acaso, vejo na frase citada (que também relembro mais ou menos nos mesmos termos) a afirmação de todas as possibilidades. A título do exemplo de Moisés, nada há a recear - o que perspetiva tudo o que de positivo se possa vir a alcançar, já que nada nos para.
      O pior já passou; resta o que há de melhor a conseguir.
      A esperança na diáspora judaica (e também humana) é precisamente essa.
      Ora vamos lá à Ana Karenina ou ao Humberto Delgado.
      Bj

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